sábado, 27 de março de 2010

Começa a ruir esquema de Dantas

Carta Capital demite Rezek


24/março/2010 17:59

Quem manda se meter com Daniel Dantas

O Conversa Afiada reproduz email Stanley Burburinho (quem será Stanley Burburinho ?):

Jogou a toalha
 

O ex-ministro do STF Francisco Rezek, no meio de um tiroteio envolvendo ações da Valepar, holding que controla a Vale, renunciou ao Tribunal Arbitral.

Rezek tinha votado a favor do Opportunity na disputa. Só que teria de se declarar impedido na votação, por já ter advogado para Daniel Dantas, uma das partes, e omitiu esta informação.


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Em entrevista a CartaCapital, o ex-ministro reafirma ter informado às partes de sua relação com o Opportunity e ataca os advogados do Bradesco e da Previ

A CartaCapital, Francisco Rezek confirmou sua renúncia à função de árbitro no caso que analisa os direitos do banco Opportunity em aumentar sua participação acionária na Vale. Sua decisão foi precipitada após CartaCapital publicar um documento oficial assinado pelo ex-ministro do STF e encaminhado ao Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem no qual ele omite ter advogado para o banco (informação que poderia tê-lo impedido de assumir o posto). A decisão do grupo arbitral presidido por Rezek beneficiou Daniel Dantas: ele poderia comprar por cerca de 100 milhões de reais ações da Vale cotadas em 2 bilhões.

A versão de Rezek consta da edição de CartaCapital que irá às bancas nesta sexta-feira 26. O ex-ministro considera-se vítima de uma conspiração e promete representar na OAB contra um grupo de advogados que representam o Bradesco e a Previ. Dois dos maiores acionistas da Vale, o banco privado e o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil questionam na Justiça a lisura de Rezek.

A seguir, a reportagem da última edição de CartaCapital que levou à renúncia de Rezek. Confira também, clicando na imagem acima, trechos do documento em que o ex-ministro não revela ao CBMA suas relações profissionais com o Opportunity.

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Árbitro e torcedor

Documento obtido por CartaCapital revela: ao contrário do que afirmou recentemente, Francisco Rezek omitiu sua posição de advogado de Dantas (clique na figura acima para ler)

Em 8 de novembro de 2007, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Francisco Rezek encaminhou ao Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA), no Rio de Janeiro, um documento de duas páginas com respostas a um questionário de dez perguntas. Logo no segundo item, Rezek teve de responder à seguinte pergunta: “Alguma vez atuou, sob qualquer forma, na defesa dos interesses das partes no processo em que está sendo indicado para atuar como árbitro?” “Não”, cravou o advogado. Mais adiante, no quarto quesito, insiste o questionário do CBMA: “Conhece alguma das partes ou advogados envolvidos no processo? Qual o grau de relacionamento existente?” Outra vez, Resek respondeu “não”. Nos dois casos, o ex-juiz da Corte Internacional de Haia não falou a verdade.

CartaCapital teve acesso ao documento citado acima, um questionário-padrão elaborado pelo CBMA para organizar grupos de arbitragem, um método alternativo – e caro – de resolução de conflitos judiciais. Assim, por livre e espontânea vontade, grupos privados aceitam transferir para terceiros (os “árbitros”) a solução de litígios, normalmente de ordem comercial. Rezek mentiu ao responder as perguntas acima para esconder sua ligação profissional com o banqueiro Daniel Dantas, do Grupo Opportunity, parte interessada e vitoriosa em uma disputa contra a Bradespar (administradora de ações do Bradesco) e a Previ (fundo de pensão do Banco do Brasil), pelo direito de compra de ações da Valepar, controladora acionária da mineradora Vale. Por conta disso, o expediente da arbitragem privada, regulamentado no País, em 1996, poderá sofrer seu primeiro revés em quase 15 anos de aplicação.

Como em quase tudo que Dantas põe as mãos, o imbróglio referente às ações da Vale mistura interesses privados, dinheiro público e graves consequências financeiras para as partes envolvidas – à exceção, é claro, do Opportunity. O cerne da questão está na atual divisão acionária da Vale, concentrada pela Valepar, dona de 53,6% do capital votante, dentro da qual se agrupam a Previ (49%), a Bradespar (21,02%) e a Elétron, ligada ao Opportunity, com apenas 0,02% das ações da segunda maior mineradora do mundo, avaliada em 282 bilhões de reais. Em 2007, Dantas argumentou que a escassa participação acionária da Elétron era uma disfunção, resultado de uma diluição provocada em 2002 por um aumento de capital. Chegou a ensaiar uma ação judicial, mas esbarrou em um artigo do acordo de acionistas da Valepar pelo qual se estabelece o procedimento arbitral para a solução de litígios dessa natureza. Entrou em campo então o Conselho Brasileiro de Mediação e Arbitragem.

Foram designados três árbitros ao CBMA, além de Rezek, indicado pelas duas partes em litígio, os advogados Gustavo Tepedino (indicado pela Bradespar e pela Previ) e Mário Sérgio Duarte Garcia (indicado pela Elétron). Em 18 de dezembro de 2009, o trio entendeu, por unanimidade, que a Elétron é titular do direito à opção de compra das ações estabelecida no acordo de acionistas. De acordo com a sentença, o momento da entrega, a quantidade e o valor atualizado das ações, além de um eventual ressarcimento pelos danos, seriam definidos em uma sentença posterior, após a produção de provas pelas partes.

Em 29 de janeiro de 2010, a CBMA proferiu uma nova decisão, de modo a esclarecer outros pedidos feitos pelas partes. No texto, confirma o cumprimento das cláusulas contratuais de acordo com o entendimento expresso na sentença anterior. Ou seja, a titularidade do direito de compra é mesmo da Elétron, a quem cabe exercê-lo plenamente. Faltou apenas uma nova rodada de arbitragem para se definirem os valores das ações e as condições de pagamento. No fim das contas, Dantas ganhou o direito de ter uma participação de 2% da Valepar. Na ponta do lápis, significa dizer que o banqueiro, condenado a dez anos de cadeia por mandar subornar, em 2008, um delegado da Polícia Federal durante a Operação Satiagraha, poderá gastar algo em torno de 100 milhões de reais para comprar ações que valem, por baixo, 2 bilhões.

Tudo lindo, tudo maravilhoso, não fosse o fato de alguém ter soprado nos ouvidos dos acionistas da Bradespar uma inconfidência sobre as ligações entre Rezek e Dantas: o ex-ministro do STF assinou uma petição feita ao Tribunal Ordinário de Milão, na Itália, em um dos processos relativos à disputa entre Dantas e a Telecom Italia, na qualidade de defensor do banqueiro, protocolada em 23 de julho de 2007. Portanto, quatro meses antes de cravar dois singelos “nãos” no questionário do CBMA, justamente nos itens nos quais se perguntava se ele havia atuado em favor ou se conhecia algumas das partes envolvidas no litígio. De posse dessa informação, a Bradespar anunciou, no início do mês, que pretende contestar a decisão da Câmara Arbitral na Justiça.

Procurado por CartaCapital para dar explicações, Rezek mandou avisar, por meio de uma secretária, que está impedido de se pronunciar sobre o caso, segundo as normas estabelecidas pelo CBMA. Em 12 de março, em entrevista ao jornal Valor Econômico, o ex-magistrado afirmou ter relatado “possíveis impedimentos” à Câmara Arbitral, inclusive para representantes da Bradespar e da Previ. Aos adversários da Elétron, garantiu ter avisado de sua participação no processo da Itália, resumida, segundo um ex-ministro, a um parecer para o Opportunity em uma ação relativa à jurisdição internacional.

Assim como Rezek não informou ao CBMA, a direção do Opportunity também não avisou aos demais interessados da existência de um impedimento flagrante na escolha do árbitro-líder do julgamento. Nem mesmo Sérgio Bermudes, advogado da Bradespar e um dos principais defensores de Dantas na disputa contra os fundos de pensão, foi alertado sobre o conflito de interesses surgido a partir da indicação de Rezek.

É possível que o ex-ministro tenha sido seduzido para a causa de Dantas por obra dos honorários destinados aos árbitros da Justiça privada. Cada um deles recebe cerca de 600 reais por hora de serviço, mas Rezek, por presidir o Tribunal Arbitral, ainda leva 20% a mais sobre esse valor, aproximadamente 720 reais por hora de serviço. O processo começou em novembro de 2007 e só acabou em março de 2010.

A ligação de Rezek e Dantas, no entanto, é praticamente impossível de ser escondida, até porque ela foi incluída em uma trama bolada pelo banqueiro para tentar desqualificar a Operação Chacal, da Polícia Federal, realizada em 2004. Dois anos antes, um esquema clandestino de espionagem montado pelo banqueiro e uma agência privada de investigação, a Kroll Associated, foi desbaratado pela PF. Lembre-se que os federais só descobriram o esquema por conta de um erro primário dos arapongas da Kroll: por engano eles seguiram o então presidente do Banco Central, Arminio Fraga, convictos de que se tratava do ex-ministro Andrea Calabi. Ao perceber a movimentação estranha, Fraga acionou a PF.

A partir daí, Dantas faz circular em várias redações brasileiras um dossiê elaborado sob encomenda para difundir as teses dele no tal processo milanês da briga com a Telecom Italia. CartaCapital tratou dessa disputa em várias reportagens. Trata-se de mais uma esperteza. Funcionários da operadora italiana são acusados de grampear autoridades e produzir dossiês em seu país de origem, mas o caso, como já ficou comprovado na Justiça de Milão, nada tem a ver com a espionagem brasileira. Mesmo assim, Dantas insiste em se passar não por autor, mas por vítima de um esquema de espionagem e chantagem montado pelos italianos e que envolveria policiais, jornalistas, advogados e autoridades. Uma completa inversão da realidade que só encontra guarida em uma banda desqualificada (em todos os sentidos) da mídia brasileira.

É justamente nesse dossiê pró-Dantas, inicialmente distribuído a jornalistas brasileiros escolhidos pelo banqueiro, que consta a petição assinada por Rezek à Procuradoria italiana, com data de 10 de julho de 2007. Além disso, há outro documento, com texto quase idêntico, entregue às autoridades brasileiras, também assinado por Rezek em 22 de maio de 2007.

É difícil saber o destino dessa primeira petição, pois não consta do dossiê a primeira página do documento. O último parágrafo, contudo, não deixa dúvida de que foi encaminhado a alguma instância no Brasil, possivelmente à Procuradoria-Geral da República: “Em face do exposto, e dos elementos de apoio anexos, pede o requerente que Vossa Excelência determine providências que, ante semelhante quadro, incumbem à autoridade brasileira por força da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional”. É essa a peça de resistência que a defesa do Opportunity maneja na tentativa de interromper todo e qualquer processo contra Dantas no Brasil. Portanto, não se trata de uma simples petição como quer fazer parecer o ex-ministro do STF.

O curioso é que os “elementos de apoio anexos”, citados por Rezek na petição a favor do Opportunity, incluem farto material jornalístico publicado no Brasil e na Itália. Entre os destaques das reportagens brasileiras estão “investigações” da revista Veja, da Folha de S.Paulo e da assessoria de imprensa Consultor Jurídico. Todas as “reportagens”, diga-se de passagem, bastante alinhadas com as teses que Dantas apresentava então à Justiça italiana.

O Consultor Jurídico não teve sequer o cuidado de disfarçar a reprodução de documentos oriundos do dossiê pró-Dantas. Em uma das “reportagens”, publicada em maio de 2009, um dos links na internet apontava para uma série de papéis, entre os quais o parecer de Rezek.

No fim das contas, Dantas meteu-se, por imprudência ou ganância, em uma nova guerra comercial, a disputa pelas ações bilionárias da Valepar, pouco tempo depois de sair de outra, a das telecomunicações. Por mais de sete anos, o dono do Opportunity brigou com os fundos de pensão, até o armistício selado em abril de 2008, que colocou um ponto final na disputa em nome da fusão entre a Oi e a Brasil Telecom. Em comum a ambas as operações, a presença providencial de Rezek, ora como defensor, ora como juiz, mas sempre a favor do mesmo cliente, o Opportunity. Pelas regras da CBMA, ao mentir sobre suas relações com Dantas, o hoje advogado tornou o processo sobre as ações da Vale passível de anulação. No caso de isso ocorrer, outro procedimento, com novos árbitros, terá de ser aberto.

Isso significa que a atitude de Rezek poderá ter comprometido uma ação processual favorável a Dantas que, do ponto de vista técnico, dificilmente poderia ser contestada. Em 13 de março, um dos árbitros do Tribunal Arbitral, o advogado Gustavo Tepedino, comentou sobre o tema durante um evento da Câmara Britânica, no Rio de Janeiro. Segundo ele, o processo foi “absolutamente transparente” e a decisão, tomada de forma preliminar, deveria ter permanecido sob sigilo. Ele fez questão de lembrar que os árbitros escolhidos foram confirmados pelas partes (Bradespar, Previ e Elétron). Para Tepedino, a nulidade do processo arbitral só é acolhida por “questões gravíssimas”. E como se poderia classificar um ex-ministro do STF pego na mentira para esconder seus vínculos profissionais com um banqueiro de má fama e condenado na Justiça?

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